Momentos Fugazes

Além do meu trabalho, passo a maior parte do meu tempo me deslocando no trajeto de ida e volta para casa, portanto as experiências significativas do meu dia acontecem no trajeto, é normalmente dentro do ônibus que muitas das minhas histórias irão se desenrolar.

Hoje não podia ser diferente. Numa conversa acalorada e interessante com um amigo, discutíamos sobre arte, eis que uma pessoa sentada um pouco a frente tomou minha atenção e apesar de ouvir cada palavra da conversa que mantive, meus olhos estavam direcionados em outro lugar-espaço-tempo.

Com os dedos, indicador e polegar sobre os olhos, apertando-os intensamente ela contorcia a face. Tive dúvidas: era um choro um riso a ser controlado?

A conversa fluiu, mas meus olhos estavam nela. A certa altura ela deu um longo suspiro seguido de um soluço, foi então que tive certeza, era um choro.

Os olhos vermelhos, marejados, carregados de dor a faziam olhar para o vazio e pensar sabe Deus o que, talvez nem Deus soubesse o que ela pensava.

O descontrole veio aos picos e cada tomada de fôlego mais ela chorava. O homem ao lado se encheu de compaixão (maldita outra vez) e tentou consolá-la:

– Não sei qual o problema, mas tenha calma moça.

Ela chorou mais, respirou mais uma vez e talvez tenha dito para si mesma o que eu digo quando preciso cessar meu choro “Você é forte, seja maior que seu sofrimento”. Ela olhou outra vez para o vazio e restou somente uma face desconsolável.

Algumas pessoas olharam para trás, mas nada fizeram e eu estava de observadora, me encantando com a diversidade do mundo, os conflitos, os medos, as alegrias fugazes, os sentimentos.

Pronto o espetáculo talvez tenha acabado. Não se espante você irá encontrar muitos “talvezes” aqui, pois fazem parte do acaso.

A frente outra linda criatura se segurava entre as colunas de ferro do ônibus, alta, branca, magra, na faixa dos seus 30 e tantos anos, cabelo negros, marcas de expressão, não menos bonita, nem tanto atraente.

Olhar baixo, olheiras que denunciavam tristeza, se tiver que apostar, ela estava a alguns segundos de um choro, compartilhando sem saber da tristeza da outra que acabará de chorar. Voltando a encantadora criatura, ela olha para baixo, serra os lábios, pensa, finalmente passa a mão no rosto, um gesto gentil, mas firme, fazendo do seu pensamento um gesto físico. Uma negação talvez. (olha ele aqui novamente)

A nossa mente divaga no espaço, pensar o que se passa na cabeça do outro nos geram muitas histórias, um frenesi de imagens e possibilidades onde o “talvez” estará presente, e você poderá reconhecê-lo por “e se”.

A tristeza estava invadindo aquele ambiente, pouco a pouco eu via em cada olhar e cada gesto uma história, uma luta travada, mas a quem diga que era meu olhar que estava triste, influenciado pelos pesares vida. Nem tudo são flores, nem tudo dores.

Olhei outra vez para minha amiga chorona agora ela tirava um selfie com o celular, queria registrar o momento ou queria apenas se ver?

Os paralelos do sentir e do ser.

Estamos tão envolvidos no caos diário, nas urgências da vida, no uso de tecnologias que até nos momentos do “sentir” nos deixamos levar pelo acalento tecnológico.

Finalizo dizendo a você, deixar-se envolver pelo seu interior, esquecer-se por alguns momentos no dia do mundo que urge pelo imediatismo, ouvir os pássaros e sentir ressoar o seu coração.

A viagem acabou, desci na parada final, minha conversa continuou, a vida continuou.

 

Francine Oliveira Escrito por:

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