Andando na rua outro dia vi um homem largado, deitado bem perto de um latão de lixo. Era quase noite, e as luzes que os postes jogavam sobre ele tornavam a cena ainda mais pesada.
Costumo sempre caminhar nesse horário, e confesso que nunca havia visto aquele homem. A rua não tem tanto movimento, e existem inúmeras casas de alto padrão, inclusive a minha, mas quase nunca tem ninguém em casa.
O cheiro que vinha do latão de lixo se fundia com o cheiro do homem, ou talvez fosse ao contrário, não sei ao certo.
Num dia passei por ele e no outro também. Fui seguindo a vida. Porém, numa noite de sexta-feira, quando minha mulher e meus filhos voltaram de viagem, chegaram afoitos e sorridentes com um pequeno cachorro dentro de uma caixa de papelão.
Já tínhamos dois cães pastores, mais um, e de rua, até era algo a se pensar. Pegamos ele junto de um sujeito que estava deitado na esquina, dormindo, perto do latão coletivo, disse minha esposa.
No dia seguinte, ao passar perto do latão, não vi o sujeito. Nem sinal de nada. O cheiro também tinha sumido. Agora, sempre que chego em casa, e vejo o pequeno cãozinho, me lembro do sujeito dormindo sob a luz dos postes. Isso me dá um aperto no peito.
Crônicas de um professor alucinado. Home office do desespero
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