Outro dia encontrei na praça um senhor de bengala e louco por um banco pra sentar. Não tinha muitas opções e o banco onde eu estava lhe pareceu atrativo.
Ajeitei-me e deixei-o sentar. Ele estava cheiroso e bem arrumado, parecia pronto para ir à missa ou a uma festa, mas o sol das 16 horas não favorecia nenhum desses eventos.
Continuei lendo meu livro, absorto e sem qualquer pretensão de interagir com ele. Alguns minutos se passaram e ele abriu sua carteira.
Pigarreou baixo e discretamente removeu do interior da carteira uma fotinho antiga. Minha leitura parou e meus olhos se enviesaram para a imagem amarelada da jovem moça da foto.
Ela era bonita, bonita para a época dela e para qualquer outra época.
O velho ficou olhando para ela e para o relógio dourado em seu pulso magro e enrugado. Quando achei que nada de interessante aconteceria, o velho começou a chorar. Fechei o livro e num impeto de ajudá-lo, indaguei.
“O que houve, senhor?”
Ele soluçou e limpou o rosto com um lenço. Disse devagar:
“Eu a encontrava todos os dias aqui, nesse banco. Mas agora ela se foi. Sempre lembro de tudo.”
Fiquei sem ação. A nossa volta as pessoas passavam e sorriam. O sol ia se escondendo atrás da torre da igreja matriz. Logo a noite viria.
“Mas o senhor se lembra de tudo? Ela era sua esposa?”
Ele balançou a cabeça timidamente como quem diz, sim, era.
“Sinto muito.”
Ficamos um tempo sem dizer nada um ao outro. Ai por fim, antes de se levantar e partir, ele me olhou e disse algo que me fez refletir sobre muita coisa.
Foram sete palavras apenas, mas que me jogaram um peso nas costas. Palavras poderosas, sábias, recheadas de sabedoria e verdade.
“As pessoas não são descartáveis, meu jovem!”
Apertou a bengala e partiu. Minutos depois, eu estava sentado sozinho, livro fechado no colo e uma dúvida eterna na mente. Nunca mais encontrei o velhinho naquela praça. Talvez tenho ido encontrar sua esposa.
Até quando vamos continuar nessa bola de neve?O amor está acabando
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